segunda-feira, 10 de outubro de 2011

A ilusão de uma língua única

Os usos da língua são situados e funcionam de acordo com uma situação comunicativa concreta:


"Nenhum linguista sério,brasileiro ou estrangeiro,jamais disse ou escreveu que os estudantes usuários de variedades linguísticas mais distantes das normas urbanas de prestígio deveriam permanecer ali,fechados em sua comunidade,em sua cultura e em sua língua. O que esses profissionais vêm tentando fazer as pessoas entenderem é que defender uma coisa não significa automaticamente combater a outra. Defender o respeito à variedade linguística dos estudantes não significa que não cabe à escola introduzi-los aomundo da cultura letrada e aos discursos que ela aciona. Cabe à escola ensinar aos alunos o que eles não sabem! Parece óbvio,mas é preciso repetir isso a todo momento.
Não é preciso ensinar nenhum brasileiro a dizer “isso é para mim tomar?”,porque essa regra gramatical (sim,caros leigos,é uma regra gramatical) já faz parte da língua materna de 99% dos nossos compatriotas. O que é preciso ensinar é a forma “isso é para eu tomar?”,porque ela não faz parte da gramática da maioria dos falantes de português brasileiro,mas por ainda servir de arame farpado entre os que falam “certo”e os que falam “errado”,é dever da escola apresentar essa outra regra aos alunos,de modo que eles –se julgarem pertinente,adequado e necessário –possam vir a usá-la TAMBÉM. O problema da ideologia purista é esse também. Seus defensores não conseguem admitir que tanto faz dizer assisti o filme quanto assiti ao filme,que a palavra óculos pode ser usada tanto no singular (o óculos,como dizem 101% dos brasileiros) quanto no plural (os óculos,como dizem dois ou três gatos pingados)."
(Trecho da fala de Marcos Bagno/UNB, posicionando-se no debate sobre o livro didático "Por uma vida melhor", disponível em: http://marcosbagno.com.br/site/?page_id=745)


Trecho do livro "Por uma Vida Melhor" apresenta a pergunta "posso falar 'os livro'?"
"O linguista diz que a escola deve ensinar a dizer Os livro? Não. Nenhum linguista propõe isso em lugar nenhum (desafio os que têm opinião contrária a fornecer uma referência). Aliás, isso não foi dito no tal livro, embora todos os comentaristas digam que leram isso.
O linguista não propõe isso por duas razões: a) as pessoas já sabem falar os livro, não precisam ser ensinadas (observe-se que ninguém falao livros, o que não é banal); b) ele acha - e nisso tem razão - que é mais fácil que alguém aprenda os livros se lhe dizem que há duas formas de falar do que se lhe dizem que ele é burro e não sabe nem falar, que fala tudo errado. Há muitos relatos de experiências bem sucedidas porque adotaram uma postura diferente em relação à fala dos alunos."
(Imagem e trecho da coluna escrita pelo professor Sírio Possenti sobre o debate do livro didático "Por uma vida melhor", disponível em: http://terramagazine.terra.com.br/interna/0,,OI5137669-EI8425,00-Aceitam+tudo.html)
E nós, professores, como trabalhamos esse debate em sala de aula? Continuamos apenas gramatiqueiros, preparando nossos alunos para serem revisores, ou como comenta Sírio Possenti em entrevista à Juca Entrevista, preparamos nossos alunos para serem ESCRITORES?
Judite Ferreira Souza



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